Um Estado opressor, o racismo, um assassinato. E você?

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O estado racista opressor, o incêndio no protesto e o abaixo assinado que você assinou autorizando aquela morte.

Quando um homem se ajoelha sobre o pescoço de outro, sabe as possíveis consequências. Quando permanece ajoelhado sobre o pescoço daquele que está imobilizado e não lhe oferece risco, mais do que um ato de violência, trata-se de uma afirmação de seu “direito” ao ato. Quando este homem é um agente do Estado, em seu horário de trabalho e uniformizado, deixa claro como o Estado daquele lugar vê seus cidadãos. E, por fim, quando este homem, agente do Estado, uniformizado, é um homem branco, ajoelhado sobre o pescoço de um homem negro, e o leva a morte com seu ato, em um país com histórico de opressão de cunho étnico racial, mais do que um óbvio assassinato, mais do que um descontrole de um mau profissional, trata-se de uma declaração ou afirmação do Estado de como deseja sua organização social. Ou seja, uma afirmação da prática opressora do Estado sobre as camadas populares que são, nitidamente, afrodescendentes. Falando com o linguajar adequado à cena lamentável a que estamos nos referindo, exposta nas fotos divulgadas na mídia, trata-se de um Estado assassino que, em pleno 2020, refirma seu “direito” sobre a vida dos outros, pela sua condição étnico-racial. Um Estado que reafirma sua base e pensamento escravocrata.

Agora, sabendo do ocorrido, e sabendo que vários protestos aconteceram e continuam acontecendo, em virtude desse assassinato, inclusive o incêndio de um prédio, se você diz que protestos são legítimos, mas que tal incêndio é um exagero… que um erro não justifica o outro… enfim, se o protesto/incêndio do prédio, ocupa mais sua fala do que o assassinato, saiba que, mesmo sem querer (quero crer), é seu olhar que autoriza o policial assassino a continuar ajoelhado sobre o pescoço daquele homem. São suas prioridades que respaldam aquele ato.

O policial assassino do Estado racista e desigual, dito como maior democracia do mundo, não matou aquele homem por acaso. Não o fez, contrariando uma lógica social. Não desafiou o pensamento dominante. Ele fez porque, como agente de Estado, representou este pensamento. Porque sabe da relatividade da indignação da maior parte da população. Jamais, nos dias de hoje haverá em um país ocidental uma lei autorizando tal ato, tanto quanto, não creio que pessoas sãs irão a público defendê-lo. Nossa sociedade avançou muito em subjetividades e hipocrisia. É o não dito e não feito, que autoriza tais assassinatos.

Portanto, saiba, quando você se indigna mais com o incêndio do que com o assassinato em questão, você é coautor do crime. Você autoriza este Estado. Tanto quanto quando se cala sobre a política de “segurança pública” que oprime e executa pessoas nas favelas e pratica o encarceramento em massa, em óbvia seletividade penal, que leva os periféricos, em sua maioria negros, às cadeias. Desculpe informar, mas enquanto sua indignação não ameaçar a opressão, não haverá vírus, pandemia ou isolamento social, que vá trazer um mundo melhor pós-quarentena, porque, depois de tudo, o Estado ainda estará lá e você também, o respaldando.

Marcelo Biar

Texto publicado originalmente em Jornal Portal. Clique aqui para acessar

Crédito da Charge: Carlos Latuff

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